"O mapa peruano mudou, nosso território cresceu. O tribunal de Haia atendeu a 70% da nossa demanda", disse o presidente peruano Ollanta Humala, diante de simpatizantes em Lima.
Já no Chile, o clima entre os políticos foi de comoção. "A decisão (do tribunal) representa uma perda lamentável para o Chile", afirmou o presidente chileno Sebastián Piñera. Na mesma linha, a presidente eleita Michelle Bachelet, que assume o cargo em março, disse que foi uma "perda dolorosa" para seu país. A expectativa é que os três se encontrem em Cuba, nesta terça, durante reunião da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos).
O assunto é sensível nos dois países e a histórica disputa marítima, que remete ao século 19, costuma ser apontada pelos especialistas como principal motivo da rivalidade entre habitantes dos dois países – que apesar disso têm intensificado, nos últimos anos, a relação comercial e econômica e a presença de trabalhadores peruanos no Chile.
Seis anos de disputa
O parecer do tribunal internacional, que não foi unânime, dá ao Peru uma parte maior do oceano Pacífico, mas mantêm áreas ricas em pesca nas mãos do Chile. A decisão foi conhecida após seis anos de expectativas e trocas permanentes de documentos e defesas orais por parte de peruanos e chilenos.
Em 2008, o Peru entrou com ação em Haia pedindo definições sobre os limites marítimos, argumentando que a área não havia sido delimitada desde a Guerra do Pacífico (1879-1883) e tampouco em documentos assinados em 1947 e 1952 (os quais, na visão do Chile, já resolviam a questão).
A decisão do tribunal internacional era esperada com enorme expectativas nos dois países.
"Acho que foi uma decisão salomônica e que deixou as duas partes contentes. O Chile manterá a área marítima que usava para a pesca e o Peru ganha território marítimo mas que ainda não tem condições e infraestrutura para usar", disse à BBC Brasil Carlos Aquino, diretor do instituto de pesquisas econômicas da Universidade Mayor de San Marco, de Lima.
Segundo Aquino, a questão histórica "foi resolvida", mas ainda é preciso ver como a decisão será colocada em prática a partir de agora. "Uma ferida aberta há mais de 130 anos foi fechada - e realmente foi o principal. Os dois países têm forte relação comercial e econômica e precisavam resolver essa questão", afirmou o professor peruano.
Na pratica, o Chile terá da costa, em Arica, no norte do país, até 80 milhas em linha reta, no oceano Pacifico, para exploração marítima. Já o Peru ganhou a partir desta marca de 80 milhas e até as 200 milhas no oceano, disse Aquino.
'Melhor que o esperado'
No Chile, o analista Ricardo Israel, que foi candidato presidencial na última eleição, disse que seu país "se saiu melhor do que se esperava".
"Claro que existe insatisfação com a parte do parecer que privou o Chile de uma área de domínio econômico exclusivo. Mas também houve o reconhecimento de que existia uma fronteira, ela era a partir do ponto que o Chile indicava e era uma linha reta com a fronteira terrestre - e não como o Peru entendia", disse Israel por e-mail.
Para ele, a partir de agora os dois países terão que fazer mudanças legais para se adaptar à definição judicial. "Seria uma boa oportunidade, uma vez por todas, de enterrar o passado e de se assinar um tratado do século 21, que enfrente temas comuns, já que as relações econômicas bilaterais são muito boas", afirmou.
Os dois países têm forte relação comercial e fazem parte da Aliança do Pacifico, que inclui também México e Colômbia. Estima-se que o Chile seja o principal investidor estrangeiro direto no território peruano.
Na visão do professor de ciências politicas da Universidade de Valparaíso (Chile), Guillermo Holzmann, ao definir o limite de 80 milhas em linha reta a área terrestre, o tribunal de Haia "preservou" a pesca artesanal, tradicional, nesta região chilena.
Holzmann entendeu também que houve uma "perda" territorial para o Chile, mas concorda que o país "perdeu menos que o esperado" e o Peru também "ganhou menos que o esperado".
Segundo ele, "não chega a ser uma decisão salomônica, mas minimiza e muito os custos políticos no Chile e no Peru".
"O maior desafio agora será a implementação dessa decisão", disse. Para Holzmann, o tribunal não definiu mecanismos para tal - e por isso mesmo, de maneira bilateral, peruanos e chilenos têm uma "oportunidade" para se começar uma "convergência" também em outras áreas, como a energética.
0 comentários:
Postar um comentário